sexta-feira, 2 de setembro de 2016

"Pesticidas naturais são tão perigosos quanto os convencionais": a nova verdade do agronegócio?

O que faz dois pesquisadores na Lapônia, Noruega e o representante dos fabricantes de agrotóxico no Sul do Brasil dizerem praticamente a mesma coisa, ao mesmo tempo?

No último dia 28/8/16, dois pesquisadores saíram nos jornais locais da Lapônia, Noruega, criticando os perigos da agroecologia, e dizendo que as substâncias químicas naturais são tão perigosas quanto as substâncias químicas obtidas sinteticamente. Assim, argumentam os pesquisadores, toda aquela conversa sobre orgânicos sem pesticidas seria uma farsa: a produção orgânica permite sim a aplicação de pesticidas naturais, então na prática é tão perigosa quanto a agricultura convencional.

A Piretrina, presente no Crisântemo, é um pesticida natural. Foto: Eleonora Enking/Flickr (CC)
Fazendo referência ao caso da piretrina, extraída do Crisântemo, o prof. Arne Grønlund, do Instituto Norueguês de Pesquisa Bioeconômica (Nibio) nivelou a conversa: "os pesticidas que são permitidos na agricultura orgânica podem ser no mínimo tão perigosos para as pessoas como outros pesticidas. A única diferença é que os compostos também são encontrados na natureza." Teoricamente hipoteticamente cientificamente semi-correto.

Dois dias depois, a BBC Brasil publicou uma notícia impressionante sobre contaminação por agrotóxicos no Rio Grande do Sul. Taxas de incidência de câncer em alguns municípios são bem maiores do que as médias locais e nacional. Na mesma toada do pesquisador norueguês, o representante da Associação Nacional de Defesa Vegetal (Andef), entidade representativa dos fabricantes de agrotóxicos, se defendeu dizendo que "toda substância química, sintetizada em laboratório ou mesmo aquelas encontradas na natureza, pode ser considerada um agente tóxico". Novamente, tecnicamente correto, mas...

Aplicação de agrotóxico sem proteção. Foto: Thinkstock

Deixemos de lado por ora a comparação totalmente esdrúxula feita pelo prof. Grønlund, e o fato de que a aplicação de pesticidas naturais na agricultura orgânica é mínima, tendo sido utilizados 3 quilos de piretrina por ano para aplicação em agricultura orgânica em toda a Noruega, contra 883 toneladas de agrotóxicos convencionais. Vamos também deixar de lado a correlação clara entre o uso de agrotóxicos e a incidência de câncer em áreas rurais no Brasil, campeão do mundo em consumo, e o fato de que os brasileiros em média absorvem cerca de 12 litros de agrotóxicos por ano.

Vamos por ora apenas nos limitar a perguntar: que tipo de sintonia quase telepático-sinistra pode haver entre aqueles pesquisadores noruegueses e os produtores de agrotóxico brasileiros?

Independentemente da conexão, a comparação serve aos interesses do agronegócio global que, com um verniz raso de "verdade científica", busca minimizar os riscos dos agrotóxicos sobre a saúde pública.

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